Ontem morreu Nadir Afonso, um dos maiores pintores portugueses do nosso tempo. Licenciado em Arquitectura pela Escola de Belas-Artes do Porto – aliás, onde mais poderia ser? –, cedo rumou ao Brasil, tendo chegado a trabalhar com Óscar Niemeyer. Desencantado com a estética que a arquitectura estava a tomar, abandonou o lápis e pegou no pincel. E em boa hora o fez.
Na verdade, foi aqui que atingiu o apogeu. Homem simples e frugal, sempre arredio dos holofotes da ribalta, ao contrário do que hoje-em-dia se passa, onde a maioria se coloca incessantemente em bicos dos pés, procurou ininterruptamente compreender o que era a arte, tendo morrido sem o saber. A conclusão mais próxima a que chegou – afirmou-o quando recentemente foi condecorado pelo Presidente da República – é que a arte é pura matemática, sendo que esta, pela sua enorme complexidade, nem os mais sábios a conseguem descortinar.
Todavia, no dia em que aquele enorme vulto da cultura portuguesa faleceu, um outro fez 105 anos. Claro que estou a falar de Manoel de Oliveira, cineasta mundialmente conhecido, e ultimamente tão esquecido pela comunicação social, principalmente a partir do momento em que se declarou cristão convicto e sobretudo quando, sem rebuço, encabeçou a grande delegação de intelectuais que recebeu Bento XVI, aquando da visita deste a Portugal.
Os media, dominados, como bem sabemos, por um certo anticlericalismo, fruto de jornalistas da esquerda caviar que enxameiam as redações daqueles, não lhe perdoaram e, de certo modo, ostracizaram-no. A notícia de ontem foi excepção que confirma a regra.
Já agora, em defesa própria, afirmo sentir-me perfeitamente à vontade para escrever estas linhas, uma vez nunca ter sido adepto da filmografia de Manoel de Oliveira. Contudo, uma coisa é não gostar dos trabalhos que faz, outra é não reconhecer o seu extraordinário valor, tanto a nível interno como externo.