O meu ponto de vista

Março 19 2012

Este texto bem podia intitular-se “Quanto vale contar uma história?”. Contar uma história é contá-la de forma estratégica, permitindo transmitir valores, conhecimentos e construir imagens e reputações. O modelo deve ser sobretudo aplicado para trabalhar a identidade individual, única, do indivíduo ou da situação.

É sabido que se transmitirmos algo em forma de estatística, ou com auxílio de powerpoints, ou ainda recorrendo a outros documentos digitais, apenas conseguimos reter, numa primeira análise, 10% da informação, para mais tarde acabarmos por tudo esquecer. Todavia, no caso de uma boa história – está implícito o ser bem contada -, por norma o ouvinte absorve 90% do que é dito e com a maior das facilidades a reproduz junto de outros.

Hoje, neste dia especial, também eu pretendo contar uma boa história. Não sei se terei arte e engenho para tal. Os sentimentos, esses, eu sei, estão marcados indelevelmente dentro de mim. Transmiti-los, porém, é outra coisa.

A tua história, ou melhor, a nossa história, serviu, essencialmente, para criar referenciais de trabalho, de honestidade, de integridade e de amor à família, os quais, em quaisquer contextos, particularmente nos dinâmicos e/ou turbulentos, em que a incerteza e a ambiguidade alastram, são baluartes inquebrantáveis.

Dizias-me nas tuas palavras, por vezes, rudes, é certo, mas sinceras, que eu tinha de construir um sentido para o alinhamento da minha vida. Que era necessário criar uma linguagem comum, de modo a que o final da história, ocorra ela quando e onde ocorrer, esteja, o máximo possível, prenhe de significado positivo.

Recordo-me daquela vez em que, ainda rapazola, te zangaste – e com toda a razão – comigo. A questão tinha a ver com o modo de aumentar o parco pecúlio que uma família numerosa dispunha. Respondeste-me, num tom de voz bem alto que ainda ecoa, passados que são tantos anos, nos meus ouvidos:

- Posso trabalhar de sol a sol, comendo apenas uma côdea e bebendo água da fonte, mas quando me deitar quero reclinar a cabeça no travesseiro e dizer, conscientemente, meu Deus, trabalhei muito e pouco ou nada ganhei, mas vivi honestamente este dia.

De uma coisa podes ter a certeza. Tal máxima ainda presentemente me guia.

Interrogo-me quotidianamente se te soube compreender. A resposta, marejada de lágrimas, é que nem sempre. Por isso, sei que entendes bem como anseio pela compreensão coerente e que diariamente a procuro. Se a encontro? Setenta vezes sete bato com a mão no peito e exclamo:

- Culpa minha, máxima culpa!

Partiste num domingo. Os teus cabelos brancos, sempre bem penteados e a tua cara bem barbeada – apesar da idade, sempre tiveste vaidade em ti e nos teus – são a recordação de um ser bom. Um grande Homem. Mais adjectivos? Para quê? Poderia dizer muito mais, mas tudo o que mais acrescentasse seria redundante.

Perdoa-me e obrigado por tudo. Por muitos anos que viva, jamais te chegarei a agradecer o muito que, por mim, fizeste.

Sim, eu sei que, afinal, não consegui contar a minha história e muito menos a tua. Insuficiência minha, é verdade, mas, mais uma vez, conto com a tua compreensão.

Até sempre.

publicado por Hernani de J. Pereira às 15:18
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Hernâni, já tinha saudades deste teu tipo de escrita. Esta é a história, conforme tu dizes, que se lê e relê com enorme prazer. Também eu já tive pai. E tal como o teu partiu para o Senhor. Que Deus os tenha na sua infinita mesiricórdia. Continua assim.
Isabel Silva a 20 de Março de 2012 às 10:45

Análise do quotidiano com a máxima verticalidade e independência possível.
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