Há quem defenda que com o avançar da idade as memórias se avivam. Talvez seja verdade. Todavia, mito ou realidade, o que importa são as recordações que assaltam os meus dias neste Verão tristonho e propício à meditação.
O palco era azul do mais intenso que já tinhamos visto. Estávamos a meio caminho entre o continente africano e o americano. Para trás tinha ficado o cenário majestoso de uma ilha esculpida por vulcões milenares. O agreste dos penhascos contracenava com a paisagem rude, de um amarelo ocre constante, mesmo nos vales mais profundos.
Entramos em cena, quais novos exploradores, armados de máquinas fotográficas – ainda de rolo, entenda-se – e com um único propósito de viver a natureza, conhecendo-a e preservando-a. Há uns bons minutos que somos escoltados por um numeroso grupo de acrobatas e brincalhões cetáceos que nos desafiam com os seus saltos e repentinas mudanças de velocidade.
Estamos todos com os olhos postos no mar explorando o azul oceânico até à linha de horizonte. O experimentado mestre do Mãe Negra, Nho Nilita, vai dando algumas informações - usando uma mistura de português e crioulo - sobre a navegação, enquanto o Sol vai mostrando, cada vez mais, a inclemência própria dos trópicos, brilhando na fraca ondulação.
Cruzamos as ondas suaves. A pouca distância avistamos um outro barco, desta vez com turistas holandeses. Parado e envolto por um conjunto de golfinhos e de improvisados mergulhadores que com eles nadam e trocam afectos. Acenam-nos radiantes como que a convidarem-nos para partilhar uma experiência que é seguramente fantástica e inolvidável.
Pouco tempo depois, de súbito, a nossa marcha é interrompida. O silêncio repentino é apenas cortado pelo bater das pequenas ondas no casco do barco. Em surdina, Nho Nilita aponta o objectivo.
(Continua)