O meu ponto de vista

Setembro 30 2013

Ontem, foi o dia de todas as decisões. Injustas, nalguns locais, certeiras, na maioria, o certo é que o povo é soberano e não se deixa enganar tanto quanto querem fazer crer. Isto significa, não tenhamos ilusões, que há que tirar ilações, tanto a nível nacional, como local. Das primeiras, em próximas crónicas abordá-las-ei, pelo que hoje impõe-se falar do que se passou em Anadia.

Bem gostaria de não dizer, mas não resisto. Eu bem avisei. Em tempos que já lá vão, eram somente facilidades e quem alertasse para o perigo que os adversários representavam era olhados e, pior ainda, rotulados de incréus, de desmancha-prazeres, para não dizer de agentes infiltrados. Gente houve que afirmou, a pés juntos, que agora é que era, que isto era – desculpem-me a expressão menos prosaica, mas foi assim que foi dito – como limpar o rabinho a bebés.

Quando era absolutamente necessário congregar o maior número de pessoas, e, sobretudo, boas vontades, indigitando os que, com toda certeza, trariam mais-valias, pois já tinham provas mais que dadas, optou-se pelo quero, posso e mando, dando apenas ouvidos às quimeras, aos yes man.

Abro um parêntese para dizer que não me alegro com a vitória dos independentes, tanto mais que de independentes não tinham e não têm nada. Até podia ganhar o PS, CDS ou a CDU que o meu estado de espírito era o mesmo. Importa, sim, analisar a derrota do PSD.

Se perder em Anadia, já representa um autêntico desaire eleitoral para o PSD, acostumado a ganhar por 60, 70 ou mais por cento, perder por uma diferença de 10% é uma hecatombe de todo o tamanho, apesar do método de Hondt lhe ter dado três vereadores, tantos quanto o MIAP. Razão tem alguém quando afirma que quem ganhou – não chegou aos 14% - foi o PS, já que o único vereador que elegeu irá ter uma importância capital, relevância essa muito superior aquela que o povo, nas urnas, lhe quis dar.

Nesta ordem de ideias, é absolutamente necessário que tais factos sejam devidamente escalpelizados, responsabilizando quem tomou atitudes inadequadas, quem desagregou em vez de unir, e, sobretudo, quem delineou uma estratégia que nunca conseguiu captar o interesse dos eleitores. Tal como venho defendendo há muito, também aqui a culpa não pode morrer solteira. A enormíssima crise que atravessamos, as medidas de austeridade extremamente gravosas que têm sido tomadas, bem como muitas das incompreensíveis medidas governamentais não podem explicar tudo. Anadia não pode ser uma segunda Madeira, i.e., em que a perda da maioria das autarquias não se deve a Alberto João Jardim, mas sim ao governo de Portugal.

Assim, ou o PSD-Anadia muda de “vida” ou falece. Por isso, o primeiro passo é colocar os lugares directivos à disposição dos militantes e deixar que sejam estes, livremente, a escolher o caminho de regeneração.

publicado por Hernani de J. Pereira às 21:52

Setembro 28 2013

As vindimas, apesar da chuva torrencial, efectuadas este fim-de-semana correram bem, tanto em grau alcoólico como em quantidade. Muito longe do tom edílico e romântico que muitos lhe atribuem – gostava de os ver vindimar e carregar os baldes de uvas debaixo de intensa chuva -, manda a verdade dizer que o enorme trabalho de um ano inteiro deu os seus frutos.

Para além da vindima debaixo de chuva diluvial, houve que percorrer dezenas de quilómetros, em cima de um tractor, nas mesmas condições climatéricas, com vista a entregar as uvas nas caves. Mudei de roupa várias vezes nestes dois últimos dias, secadas à força do lume constantemente aceso na lareira, sem me queixar e muito menos deixar de agradecer a Deus.

Hoje, da parte da tarde, foi de descanso. Presumo que merecido. Porém, o Altíssimo saberá melhor que eu. Sei, porém e de fonte segura, que o FC Porto ganhou e o Benfica empatou. O que se pode pedir mais?

publicado por Hernani de J. Pereira às 22:48

Setembro 26 2013

Já diziam os antigos que “casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão” e é bem verdade.

Há vários anos que temos visto o caminho que conduziu à situação em que nos encontramos. Décadas e décadas de exagero e desperdício, de ostentação e irrealismo – não só por responsabilidade portuguesa, mas, pelos vistos, também pela maioria dos dirigentes da nossa velha Europa -, atiraram-nos para o pesadelo que estamos a viver.

Todos os que gerimos as nossas casas com o salário mensal, sabemos bem que os gastos não podem exceder os ganhos. Sabemos ainda que, se não pagarmos as prestações do que adquirirmos a crédito, perdemos esse bem que, erradamente, julgávamos já ser nosso. Ora, se estendermos isto às organizações, quer sejam públicas ou privadas, sabemos muito bem o que acontece. Hoje-em-dia que tanto se fala dos islandeses, perguntem-lhes como resolveram os seus gravíssimos problemas.

Brevemente vamos deparamo-nos com o Orçamento de Estado para 2014 e, com toda a franqueza, não sei muito bem o que dizer. Irá, certamente, continuar a ser um orçamento de gastos e não de ingressos e, logo, implicará um decréscimo económico e um aumento de desemprego, uma vez que todos (empresas, trabalhadores e instituições) sentirão ainda mais asfixia do que já sentem.

Perguntar-me-ão se gosto? Não, não gosto! Se, por outro lado, vejo alternativa? Não, não vejo! Contudo, espero algo de positivo. É que uma réstia de esperança ainda acalenta o meu espírito, embora nenhuma voz tenha sequer indicado uma ideia plausível.

Sei que a “medida em que medirdes será usada para vos medir” e, por conseguinte, acredito na boa vontade de quem está a tentar resolver um problema que herdou.

publicado por Hernani de J. Pereira às 21:34

Setembro 25 2013

No passado domingo Angela Merkel obteve uma retumbante vitória, ficando a escassos pontos de obter a maioria absoluta. Num país que, por opção política, não possui ordenado mínimo, mas apresentando um desemprego bem próximo do zero por cento, é obra.

Em Portugal, como era previsível muita gente houve que esgotou as pastilhas de Rennie, tal foi o mal-estar sofrido.

Sendo certo que as eleições alemãs nos interessam muito mais do que a maioria pensa, também é verdade que a importância que os media e, por conseguinte, dos portugueses foi diminuto. E é pena, uma vez ser a Alemanha e, sobretudo, a sua chanceler que terão as rédeas do nosso futuro a curto e a médio prazo.

Por ser muito cedo para falar dos Estados Unidos da Europa é conveniente não hostilizar aquela, sem que seja necessário denotar qualquer servilismo. No olhar atento que devemos lançar sobre o comportamento dos líderes de países importantes para a União Europeia, como é o caso da Alemanha, ressalta a ausência de reconhecimento por parte de muitos dos nossos políticos, essencialmente os da dita esquerda.

De modo algum poderemos falar num verdadeiro renascimento europeu, nem mesmo com as naturais limitações que Jean Monnet, um dos pais fundadores desta ideia de Europa, obrigatoriamente sentiu, mas podemos citá-lo nesta hora difícil e decisiva lembrando que, “mais do que coligar Estados, importa unir os Homens”.

Será, sem dúvida, este o caminho que deveremos mostrar à “nova” Ângela Merkel, de modo a que esta possa honrar a memória de outros líderes alemães, verdadeiramente empenhados na Europa, como foi o caso de Helmut Kohl. Porém, repito, sem oposição sistemática, uma vez não podermos pretender que nos emprestem dinheiro segundo as nossas regras.

publicado por Hernani de J. Pereira às 20:30

Setembro 23 2013

1. Tal como sempre defendi, algumas escolas começam a inserir nos seus regulamentos internos normas que prescrevem o modo como os alunos se devem apresentar na escola. Assim, decotes excessivos, calças excessivamente descidas, saias demasiado curtas e sandálias de praia são proibidas.

Sem pretender “armar” em moralista, mas também não querendo passar por hipócrita, e sem exigir que os discentes venham de fato de gala, não deixa de ser verdade que se deve incutir nestes a noção de que a sua apresentação na escola não é igual a uma ida à praia. A Educação também passa por aqui.

Se até aqui estou convencido que muitos me acompanham, o caso muda de figura quando aparece logo uma mãe ou um pai que quer saber quem e como se define o que é um decote excessivo ou uma saia demasiado curta. Bem sei que o conceito é um tanto ou quanto subjectivo, mas todos temos olhos na cara e, sobretudo, bom senso para sabermos exactamente o que é decente e o que ultrapassa as raias do razoável, sob pena de um dia destes aparecermos nus e não nos admirarmos. É que, como diz o povo, primeiro estranha-se, depois entranha-se e, por último, habituamo-nos.

Só se lamenta que relativamente aos professores e funcionários os aludidos regulamentos não definam qualquer “dress code”. É que também aqui se vê cada figura!

Uma adenda para dizer que, em 2010, o Bloco de Esquerda levou este tema à Assembleia da República, aliás sem quaisquer resultados. Para alguém que também quer terminar com o piropo, seja ele de que natureza for, não nos podemos admirar!

2. O ano passado um larápio introduziu-se num minimercado de Albergaria-a-Velha e com uma ameaça de uma pistola tratou de sacar umas massas - não das alimentícias, entenda-se - da loja.

Como é óbvio o proprietário ofereceu resistência e apesar de ferido com um tiro numa das pernas, com auxílio de um outro cliente, conseguiu manietar o assaltante, ficando este com algumas escoriações, certamente provocadas por aquilo que todos estamos a pensar, que o obrigou a receber ligeiro tratamento hospitalar.

A notícia não tinha nada de mais não fosse o caso do delinquente ter colocado o dono do estabelecimento em tribunal, exigindo-lhe uma indeminização de 15 000 euros, alegando ter sido agredido.

É mesmo para dizer que o mundo anda ao contrário!

publicado por Hernani de J. Pereira às 20:58

Setembro 22 2013

Foi um fim-de-semana extraordinário. Assim foi de verdade, tal como outros houve que foram perfeitamente deprimentes e acerca dos quais pagaria tudo ou quase tudo o que possuía para que não tivessem acontecido. É a vida … como diria o outro.

Iniciou-se o périplo pela vindima das uvas brancas. E, ao contrário do que temia, devido ao stress das videiras, provocado pela ausência de chuva, tive mais quantidade que o ano transacto e com maior grau alcoólico. Já agora, só peço a Deus que a chuva que se anuncia para a próxima semana não danifique as uvas tintas e, por isso, não transforme a vindima mais penosa do que ela já é. Sim, porque ao contrário do que se apregoa, bem como do sentir despropositado e da realidade desfasada conjecturada por muitos citadinos, a vindima não é uma festa e de folclore tem muito pouco ou nada.

Por outro lado, apesar de saber que alguns dos meus leitores abjurarão este dado – em tempos assim foi -, a matança da porca, por mim criada somente com alimentos que a bendita terra dá, ocorrida neste sábado, seguido do sarrabulho, das febras acabadas de cortar e grelhadas de imediato no carvão, temperadas apenas com uns ligeiros salpicos de sal, isto para não falar dos torresmos, foi outro momento alto. O largo conjunto de familiares e amigos, que à mesa reuni, disso deram testemunho.

Hoje, contudo, o dia foi de descanso. Por isso, a ida à Praia de Mira foi a escolha certa. E, em duas palavras, resumo como estava: simplesmente maravilhosa. Fomos cedo, uma vez o calor, que se fez sentir logo pela manhã, a isso convidava. A leitura do jornal, logo após a chegada, foi obrigatória. O almoço, há muito combinado, foi uma caldeirada mista, divinamente servida no “Lila”, acompanhada de um vinho branco maduro, bem fresco, como convinha. A terminar, um excelente melão como há muito não comia. O resto da tarde foi passado entre uma ligeira sesta e o tagarelar sobre isto e aquilo, entremeado com uns finos, bebidos no bar da praia, uma vez que garganta, devido à secura, isso pedia.

Tarde que ainda deu para comprar, na própria praia, umas petingas, fruto da pesca por “arte xávega”, e que mais tarde se comeram fritas guarnecidas com um belo arroz de tomate.

Para terminar dia em beleza só necessitava que o FC do Porto vencesse no campo do Estoril, o que acabou por não acontecer. O empate 2-2, apesar de terem estado a vencer por duas vezes, soube a pouco e resume o pior jogo que os campeões fizeram nesta época.

Bem, nem tudo pode ser perfeito!!!

publicado por Hernani de J. Pereira às 22:44
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Setembro 19 2013

Existe uma ideia generalizada que tudo o que se passa no estrangeiro, sobretudo nos países mais evoluídos, é que é bom, enquanto em Portugal é uma confrangedora miséria. Trata-se de uma noção limitada, aparentemente confortável, mas fora da realidade actual.

Ninguém duvida que existem muitas ameaças na globalização da economia e para nós, um país com pequeno mercado interno e pouco competitivo, essas advertências são exponenciais. No entanto, há muitas oportunidades por explorar, sendo, muitas vezes, apenas uma questão de visão. Atenção que não basta colocar óculos ou mudar de lentes, mas antes mudar de perspectiva, o que pode ser sinónimo de criar valor. E isso é verdade!

Ao invés de nos queixarmos sobre o que não temos, há que alavancar o que temos, por pouco que seja, e nos fixarmos no que queremos alcançar. É óbvio que dá muito mais trabalho criar do que reclamar. Contudo, não nos falta massa crítica suficiente para, promovendo novos heróis – verdadeiros heróis, entendamo-nos – conquistar novos mundos e alargar a vista a outros horizontes.

Se ajudaria termos um Estado eficiente, com um papel facilitador, bem organizado e justo? É evidente que sim. Todavia, à falta desse ideal devemos avançar e não ficarmos estagnados no pântano em que, imensas vezes, gostamos de estar mergulhados.

Podem dizer que sou um optimista empedernido e eu não o negarei. Por isso (re)afirmo que, com tudo aquilo que Deus nos deu e o Afonso, bem como os que lhe sucederam, conquistaram, ainda se pode viver muito bem em Portugal. A partir deste pressuposto temos um mundo à nossa espera. Tenhamos, então, criatividade, arte e engenho para contribuir para um mundo melhor … gerando valor.

publicado por Hernani de J. Pereira às 23:16
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Setembro 17 2013

Novamente volto ao tema da educação. Como é costume dizer “deve malhar-se no ferro enquanto está quente”.

Quando se começa a preparar um novo ano lectivo e se pretende pensar qual o caminho a seguir, é importante lembrar que nem todos os pontos fortes são úteis, nem todos os pontos fracos são limitações, tal como não se deve considerar que todas as oportunidades são oportunas e todas as ameaças são perigosas. Nas encruzilhadas da vida de uma escola há que ponderar tudo isto, tendo sempre em atenção o enquadramento, o momento e, sobretudo, as necessidades.

Sempre se falou da crise – é certo que hoje mais que nunca – e muito se fala da sua ligação com “oportunidades”. Eu próprio já aqui abordei esta temática por diversas vezes. Mas, a oportunidade de crescer com a crise coabita com a ameaça de ser vencido pela mesma.

Também sobre a escola muito se comenta. Fala-se dos professores do quadro sem horário, os célebres horários-zero, dos milhares de candidatos à docência que não conseguiram contrato, da constituição de turmas, da redução do número de alunos, entre tantos outros assuntos relevantes.

E a propósito da redução de número de alunos nas nossas escolas é bom reflectir sobre dois ou três tópicos. O primeiro, e apontado por todos, alude à diminuição da natalidade, facto indesmentível, uma vez que as estatísticas, sem margem para dúvidas, o demonstram. Para piorar o mal-estar, as projecções admitem que, dentro de três ou quatro anos, teremos cerca de quarenta mil crianças a menos no ensino obrigatório. Depois há uma acentuada deslocação de alunos do ensino público para o particular e cooperativo, motivo que nos deve levar a pensar seriamente nos porquês, sem demagogias, sem “tiros nos pés”, de cabeça arejada, livre de ideologias que nos formataram – e querem formatar – durante uma vida inteira. Relembro apenas isto: muitos professores do sector público existem que têm os seus filhos em escolas particulares, não acreditando, de modo algum, que é apenas por uma questão de proximidade e/ou comodidade. O terceiro ponto refere-se a casos concretos de diminuição de alunos de uma determinada escola por efeito de deslocação das crianças e jovens para outras escolas, com a agravante dos pais, professores nessa escola, posteriormente se queixarem de não terem horário. Pudera!

Neste último caso, podem argumentar com a necessidade dos seus educandos frequentarem outras ofertas educativas, irem para escolas com melhor qualidade(!!!), ou porque os colegas desde a escola primária – não se ofendam os puristas, pois tenho o maior respeito por quem ensina as primeiras letras – também vão para cidade e, por essa razão, não se querem separar, etc., etc. A verdade é que todos estes argumentos são falaciosos e, por isso, facilmente desmontáveis. Por estar ao alcance de todos a sua compreensão, escuso de vos maçar, tanto mais que a crónica já vai demasiado longa.

Continuação de bom ano lectivo.

publicado por Hernani de J. Pereira às 21:16

Setembro 16 2013

Mais um ano lectivo se inicia. Sob o signo de alguma incerteza, é certo, impondo assim maior poder de criatividade, de capacidade analítica e consequentemente de novas estratégias. O momento económico que vivemos cria um ambiente que afecta a todos: pais, alunos, professores e funcionários. Simultaneamente torna a conjuntura extraordinariamente competitiva, i.e., muito mais exigente – observe-se a “luta” mais ou menos surda entre os funcionários no activo e os reformados, o desfasamento, para não dizer afastamento, entre mais novos e mais idosos, as posições muitas vezes antagónicas entre quem tem um trabalho, mesmo que mal pago, e aqueles que se encontram desempregados -, obrigando os “sobreviventes” a encontrar fórmulas alternativas de modo a criar valor e conquistar “novos mundos”.

A escola, outrora, lugar de concórdia, uma vez que as disputas eram escassas e resumiam-se a casos meramente pontuais, é, hoje em dia, palco de lutas internas e de “graxistas” que tentam demonstrar evidências, nem que sejam – desculpem-me o termo - da treta. E isto não se resume apenas ao corpo docente. “Da necessidade se faz o engenho …”, diz a sabedoria popular. Pois bem, então, de uma vez para sempre, que nos convençamos que estamos exactamente perante este desafio: vale tudo, menos arrancar olhos, tanto mais que os exemplos vêm de cima.

Senão vejamos: aos despedimentos na função pública chamam-lhes eufemisticamente requalificações; relativamente aos cortes dizem que não passam de contribuições extraordinárias de solidariedade; à austeridade crescente que nos deixa os bolsos completamente hauridos, sem que se vislumbrem grandes resultados – bem, parece que ultimamente se começa a entrever um ténue luz ao fundo túnel, mas cuja ameaça da continuação dos altos juros, que pendem sobre a nossa excepcional dívida, nos deixa de pé atrás – designam-na por ajustamento orçamental.

Noutros momentos da nossa história soubemos aproveitar a adversidade de estarmos rodeados por um reino maior para nos aventurarmos em novas conquistas. Também não tínhamos alternativas … e conseguimos aceder a riquezas que nos suportaram durante 500 anos. Infelizmente, digo eu. E digo infelizmente, porque isso fez de nós um povo sempre à espera de “novas descobertas” que nos permitissem viver “à grande e à francesa” com escasso esforço. E, na verdade, isso voltou a suceder nas últimas décadas: descobrimos outro El Dorado, os fundos comunitários. E para não nos desvirtuarmos, i.e., sermos iguais a nós próprios, mais uma vez desbaratámos os muitos milhares de milhões que recebemos. Foi um fartote de estádios, hoje vazios e a deteriorarem-se, de auto-estradas onde praticamente não passam carros, de escolas topo de gama onde não existe dinheiro para a mínima manutenção, entre tantos outros elefantes brancos. Enfim, como uma ex-ministra disse, “foi uma festa”.

Voltando à escola e propriamente a este início do novo ano escolar, apenas desejo que os mais “pequenos” possam sonhar na mesma dimensão dos “maiores”. Há que aproveitar as vantagens intrínsecas de cada um – posicionamento profissional, cultura e ambiente social – para a partir de aí conquistar mais-valias.

Bom ano lectivo para todos.

publicado por Hernani de J. Pereira às 20:52

Setembro 15 2013

O pianista tocava uma música que não me era estranha, mas que, com toda a certeza, não conseguia descortinar. Presumi que fosse Mozart e apeteceu-me perguntar-lhe se, na verdade, assim era. Todavia, deixei-me estar sentado na poltrona, uma vez pouco importar o autor. O essencial era o momento, a quietude, a paz de espírito e a extrema sensibilidade que aquela acarretou e, sobretudo, para onde nos transportou.

Demos as mãos, olhámo-nos nos olhos e, sem darmos por isso, beijámo-nos ternamente sem que os lábios se chegassem sequer a tocar. A sintonia era completa e isso bastava-nos.

A tua água aquecia no copo, o meu conhaque arrefecia no balão. E isso que interessava? O relevante estava noutro âmbito e esse não podia ser repetível e, por isso, havia que aproveitá-lo, pois, conforme se costuma dizer, “aquilo que não fizeres hoje não poderás fazer amanhã”, pelo menos na assunção da verdade de que tudo o que é adiável deixa de ser igual e, principalmente, ter o mesmo valor.

O silêncio gritava palavras ensurcedoras que ecoavam nas vetustas paredes da sala daquele velho palacete. Não necessitávamos de dizer o que quer que fosse, pois o olhar, o toque, as carícias falavam mais que mil palavras.

No silêncio da sala, os acordes do piano continuavam. Nenhum dos outros presentes proferia palavra. Por um lado, por respeito a quem devotadamente se dedicava a algo que realmente ama, produzindo o êxtase dos sentidos, por outro, porque, imaginámos que à nossa semelhança, também para eles a música se sobrepunha às palavras tornando-as supérfluas.

Ao fundo da sala de pé alto, bem ao estilo vitoriano, o pianista continuava deliciado e a deliciar-nos com as suas notas, agora, sem margem para dúvidas, de Chopin. Das três grandes janelas rasgadas de alto abaixo, por entre as cortinas, entrava uma leve brisa, ajudando a arrefecer a cálida noite deste Setembrão quente e abafado. Do lado oposto, três aberturas em arcos ogivais dão para um pequeno bar, onde alguns casais bebericavam cocktails próprios da época. De volta à sala, observámos uma série de conjuntos de poltronas de cor verde, onde nos sentámos. Iluminados q.b. por candeeiros de pé-alto acrescentam o tom romântico ao lugar. No meio uma pequena mesa onde nos serviram as bebidas. A decoração das paredes, sóbria para que não sejamos distraídos do essencial, é feita especialmente à base de faianças antigas. Numa das paredes, um armário em madeira, dos finais do século XIX, inícios de XX, não sei precisar bem, contém uma série de livros antigos sobre as prateleiras, cujas frentes se encontram revestidas de finas rendas, fazendo lembrar as velhas casas senhoriais outrora tão em moda. Um serviço de chá das Índias ocupa a parte inferior, trazendo-nos à memória outras ocupações e outros ambientes, cujas reminiscências, porventura, há muito se desvaneceram. Do tecto, magnificamente trabalhado em estuque, pende um enorme candeeiro de madeira com oito braços, o qual desconfiamos que não acende, mas que, em boa verdade, falta alguma faz.

De vez em quando, aliás muito raramente, trocávamos umas palavras, não que fossem necessárias, mas que a degustação do momento a isso obrigava. Palavras ditas em surdina, mas que o balbuciar dos lábios chegava para entender.

Deixámos o bar cerca da uma da manhã. Esperávamo-nos uma noite em que os nossos corpos acabariam por se desfazer da pouca roupa e se constituíram em autênticos instrumentos musicais, tantos foram os lugares onde tocámos e destes brotaram outros prazeres.

publicado por Hernani de J. Pereira às 20:02
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Análise do quotidiano com a máxima verticalidade e independência possível.
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