Ele esperava-a na esplanada, lendo o jornal e bebendo um café. Como assim, havia que matar o tempo com algo. Ao fundo via-se o areal e, mais além, o mar. As gaivotas sobrevoavam os céus, grasnando como que estivessem a chamar por ela. A necessidade em manter a continuidade visual ditou a escolha do local. O magnífico sol que iluminava aquela manhã de sábado, ainda primaveril, é certo, mas já a cheirar a Verão, conferia ao sítio o melhor de dois mundos: de um lado o ambiente cosmopolita da cidade, do outro o telurismo do jardim, simultaneamente sossegado e recatado tanto quanto possível.
De repente, ela apareceu, como do nada viesse, subindo as escadas, devagar, mas com a respiração ofegante e as faces rosadas. Por entre o decote do vestido Versace vislumbrou um soutien preto com rendas cor-de-rosa. Quando a cumprimentou sentiu o perfume do Chanel nº 5, aquele que ela bem sabia ser o seu preferido. Apesar de tantos anos, há odores que não se esquecem.
Todavia, o mais importante foi sentir o seu coração bater descompassadamente quando se encostou a ele. Também não era para menos, pois o (re)encontro, ao fim de mais de trinta anos, assim o ditava. Ele, pelo seu lado, bem sabe que demonstrou o contrário, mas a verdade é que a calma que denotou era, no fundo, só aparente.
Perguntou-lhe se queria tomar algo. Respondeu-lhe que não e, face ao adiantado da hora, foram, de imediato, almoçar. O restaurante, situado nas cercanias, de cujas janelas se via o mar “chão”, serviu-lhes sardinhas assadas com pimentos, acompanhados de um D. Ermelinda, aliás um belo vinho tinto alentejano, não escolhido, certamente, ao acaso. O peixe, apesar da frescura, ainda não possuía o tamanho e a gordura suficiente para, como se diz na gíria, pingar no pão. Contudo, a desejo soube-lhes maravilhosamente. A conversa girou à volta dos acasos da vida, dos amores feitos e desfeitos, da família, principalmente dos filhos, dos amigos de então e, sobretudo, das venturas e desventuras, tendo chegado à conclusão, que, muitas vezes, para ambos, a vida foi mais madrasta que mãe.
A tarde prolongou-se com um breve passeio, assegurando, assim, o ambiente propício para dissolver os restos de tensão que ainda pairavam no ar. Foi a meio deste que, passadas mais de três décadas, se voltaram a beijar. Um beijo profundo, longo, levando-os ao êxtase e facilitador de um premissa-base de todo o dia: recuperar o tempo perdido.
O resto da tarde foi para se voltarem a (re)descobrir. Apesar dos anos e dos filhos, o seu corpo continua igual, firme e seguro de si. No entanto, relevante foi a intensidade com que voltaram, mutuamente, a descortinar cada pedaço do corpo do outro. A roupa rapidamente voou desnudando os corpos frementes de desejo, os lençóis foram amarrotados, as bocas uniam-se a cada segundo, os corpos suados pediam mais, até que …
A tarde foi pequena para uma ânsia acumulada por anos e anos de espera.
O sol já se tinha posto quando se despediram. Na linha do horizonte, por força do ocaso, um raiar avermelhado fazia brilhar de uma cor variada o mar, tantas vezes visto e revisto. Naquele dia, porém, diferente!