Têm sido imensas as alterações anunciadas na educação para começar a vigorar no próximo ano lectivo, de entre as quais, destaca-se, pela sua relevância, o novo desenho de organização curricular do ensino básico e secundário.
Quem, porventura, tenha cogitado que por não ter dado abertamente a minha opinião sobre tal matéria é porque estive desatento está completamente enganado. Em tempo oportuno, nos locais que achei adequados, expressei oralmente e por escrito a minha opinião. Sendo certo que fui escutado nalguns itens e ignorado noutros, penso ser a altura devida para, publicamente, dizer o que penso sobre este assunto. Reflexão que, com toda a certeza, não se esgotará neste texto, pelo que o mais natural é voltar “à carga” noutra ocasião.
Mas vamos por partes.
O estabelecimento de exames – não concordo com o diminuto peso na classificação final – no quarto e sexto anos a Língua Portuguesa e Matemática são de saudar. Aliás, nunca deveriam ter sido extintos.
Já a continuação das Actividades Extra-Curriculares (AEC) no primeiro ciclo é de estranhar, pois, para além de pouca ou nenhuma valia trazerem ao ensino, é uma enorme fonte de despesismo. Isto para não falar de que as crianças, nestas idades, necessitam obrigatoriamente de brincar e jamais passar um dia inteiro dentro de quatro paredes. Só vejo uma explicação: o lobby dos pais é forte e há que lhes continuar a dar o que, de certo modo, sempre pretenderam, ou seja, ter os filhos o máximo de tempo à guarda da escola.
Entrando no segundo e terceiro ciclo, o fim, há muito anunciado, das áreas disciplinares não curriculares, vulgo NAC, é, sem sombra para dúvidas, das medidas mais acertadas a que urgia colocar ponto final. Como é por todos sabido, tal nasceu com a reorganização curricular implementada em 2001, pela mão da iluminada “eduquesa” e “xuxalista” que se dá pelo nome de Ana Maria Benavente, nunca dando quaisquer proventos, bem pelo contrário, pois era considerada uma autêntica perda de tempo. Os respectivos tempos lectivos, ao serem distribuídos pelas mais diversas disciplinas, é, sem dúvida, uma medida que vai ao encontro de uma velha reivindicação dos docentes e, por isso, em boa hora implementada.
Outra coisa, diferente, foi o desmembramento de Educação Visual e Tecnológica (EVT) em duas disciplinas distintas, dadas de semestralmente e de forma individual por dois docentes. Não concordo em absoluto, apesar de haver alguma lógica na decisão tomada e, assim, a compreender. Senão vejamos: aquando da dita reorganização curricular a docência desta disciplina era dada por dois docentes, sendo que obrigatoriamente um deles era de Educação Visual(EV) e outro de Trabalhos Manuais. Ora, tal imposição tinha como pressuposto a assunção do ensino de duas componentes – uma ligada à parte visual/estética, outra mais virada para a componente prática/tecnológica – aos alunos. Todavia, como é do conhecimento geral, a dita norma foi, pouco a pouco, caindo em desuso, ora por conveniência dos professores, ora por ausência de docentes de um dos “ramos”. E o certo é que na maioria das escolas EVT passou a ser dada quase exclusivamente por docentes com formação em EV, desvirtuando, deste modo, a alma mater da disciplina.
O que estou completamente em desacordo – e não pensem que estou a puxar a brasa à minha sardinha, pois a idade e número de anos de serviço dão-me a tranquilidade necessária para o não fazer – é com o fim de Educação Tecnológica (ET) no terceiro ciclo. Quanto muito, a proposta deixa à consideração das escolas optarem ou não, alternando com TIC, o ministrar da ET.
Ora, numa altura em que o desemprego se instala principalmente nas áreas humanísticas, deixamos que se liquide ou reduza o potencial dos discentes descobrirem a sua vocação, despertando-os para as mais variadas profissões técnicas, bem como prosseguirem, mais tarde, estudos no âmbito da engenharia, áreas de que o país tanto necessita.
Quando são os próprios empresários, nacionais e estrangeiros, a lamentarem a falta de formação dos nossos jovens, levando, inclusive, alguns a investirem em países com mão-de-obra mais qualificada, eis que o governo, com a presente proposta, dá a machada final. É o academicismo em força, ao arrepio das necessidades do país, repito, e do futuro dos nossos jovens.
Aliás, se observarmos o sistema educativo alemão e, sobretudo, o vigente nos países nórdicos que tanto gostamos de gabar, observamos um reforço da componente prática. Em Portugal, como sempre, adoramos inovar, mas pela negativa. Infelizmente.
A não ser que se queira voltar às antigas escolas técnicas. Todavia, se o caminho é esse, o mesmo não se faz de um momento para o outro e custa imenso dinheiro – edifícios, equipamentos, recursos humanos, etc. – coisa que, hoje-em-dia e nos anos mais próximos, como todos sabemos, não existe.
Quanto ao reforço horário das disciplinas ditas científicas, tenho as minhas dúvidas, uma vez que, como aqui, por diversas vezes, já escrevi, tal como os problemas do país não se resolvem apenas colocando mais dinheiro em cima – atente-se que foi isso que nos levou a um estado de pré-bancarrota -, também aqui o cerne da questão não está em ter mais ou menos horas, mas sim no apetrechamento de laboratórios e, sobretudo, no facto de haver ou não professores que saibam o que é uma experiência científica. Desconfio que vai ser mais do mesmo e, nessa ordem de ideias, o insucesso não vai diminuir, bem pelo contrário. Aliás, vejam-se os casos de Língua Portuguesa e Matemática que, por muito que o número de horas tenha aumentado, o insucesso não decresceu.