Por sempre ter reconhecido o papel primordial do director de turma e, sobretudo, pelo excesso de carga burocrática que lhe é imposto, enquanto responsável pela gestão escolar, fui dos primeiros a conceder mais uma hora semanal aos directores de turma, mesmo antes da introdução da disciplina de Formação Cívica (FC), ocorrida aquando da reorganização curricular de 2001 – Decreto-Lei nº 6/2001, de 18 de Janeiro -, facto, aliás, que continuou.
Todavia, ao longo de dez anos da vigência de tal normativo, os pressupostos que estiveram por trás do surgimento desta área não curricular, foram, como é por todos sabido, completamente desvirtuados. Esta passou, fundamentalmente, a ser utilizada como um espaço de gestão dos conflitos de turma, quando, obrigatoriamente, o deveria ser na aula suplementar que possuem no seu horário.
E, por muito que os respectivos docentes digam que isto também é formação cívica, manda a verdade dizer que não o é. A educação cívica, no mais intrínseco do seu ser, deveria actuar na defesa do respeito pela família, na apologia dos nossos valores ancestrais, no amparo ao bem comum e, sobretudo, na alegação da honestidade e urbanidade. Contudo, estas matérias raras vezes estiveram presentes.
Para além do tratamento de casos de indisciplina, esta área tem sido aproveitada pelos defensores do eduquês para promover, principalmente, aspectos fracturantes como por exemplo: a educação sexual, o activismo social e político, a (des)construção de um (novo) Estado, e a cereja em cima do bolo, a participação activa de todos, fazendo crer que a sala de aula mais não é do que uma assembleia popular onde o voto do professor é igual aos dos alunos, auxiliando de modo exponencial o minar da autoridade daqueles.
Para ajudar à festa daqueles que acham que a escola deve continuar a ser um sorvedouro de dinheiro, mesmo sabendo que mal temos para comer, vem o Provedor de Justiça afirmar que o fim de FC põe em causa compromissos internacionais. Engraçado, ou melhor, não tem graça nenhuma, o certo é que nunca o vi levantar a mais leve voz sobre a relevância que representa a possibilidade de não cumprirmos os acordos financeiros assumidos com os nossos credores. Ou será que também é de opinião de que, pura e simplesmente, tais não se devem honrar e pagar a dívida não passa de brincadeira de crianças?
Também o Conselho Nacional de Educação – mais uma estrutura xuxalista que nunca mais tem fim – vem colocar o seu dedo (sujo!) na ferida. Ontem, em DR, fez publicar uma recomendação, a qual, ao longo de quatro fastidiosas páginas, tenta fazer a abonação da educação para a cidadania – o nome é bonito e fica bem. Com imensas citações - Boaventura Sousa Santos, Maria Emília Brederode Santos, entre outras, não podia deixar de estar, não é? –, remata com esta pérola: no âmbito de atividades específicas de educação para a cidadania deve haver oportunidade para problematizar os fatores indutores de situações de risco e de vulnerabilidade social, que colidam com os direitos humanos. A educação para a cidadania deve basear -se em metodologias racionais e participativas que apelem aos conhecimentos científicos, técnicos e humanísticos, e que promovam o espírito crítico, o desenvolvimento moral e o desenvolvimento cognitivo dos estudantes.
Digam lá se isto não é belo e harmonioso? E, ainda por cima, dá para tudo e para nada!
Ora, sabendo que anda por aí uma polémica sobre o fim da FC, como se tal representasse o fim da nação, preconizo que, para além das duas horas inscritas no horário do director de turma e que fazem parte dos respectivos normativos legais, deve haver uma terceira, com o intuito simples de resolver os casos de indisciplina, articular actividades extracurriculares, etc. Mas, por favor, não lhe chamem nomes! E, já agora, todas elas, repito, todas a descontar na componente não lectiva. Só nos casos em que tal não seja possível, então, dever-se-á avançar para a parte lectiva.