Face ao grave momento político, atrevo-me a escrever-lhe esta carta aberta. Assim, como introdução relembro a V. Exª, em termos de retrospectiva, os passos mais importantes do curto reinado de Pedro Santana Lopes (PSL):
Alteração da orgânica governamental, mudando ministros a seu belo prazer, mas sem aproveitar os melhores;
Rodeou-se de amigos sem esquecer mordomias;
Logo na tomada de posse o inesperado aconteceu: discurso desconexo, ministros que o foram sem o saberem antes (Assuntos do Mar) e danças de secretários de estado (Combatentes/Cultura);
Transição, de um dia para o outro, de um clima de austeridade para o desafogo, como que por milagre;
Descoordenação governamental: Casos GALP (N. Guedes versus Álvaro Barreto), descida de impostos (Bagão Félix versus Santana Lopes); etc.
Comunicação social, com os casos de Marcelo Rebelo de Sousa, RTP, RDP, DN e LUSA;
Comunicado sobre a sua eventual sesta;
Adiamento de tomada de posse de governantes para comparecer no casamento da filha da sua chefe de gabinete, invocando, para isso, dificuldades de agenda;
Remodelação de ministros quando se esperava apenas de secretários de Estado, sem que alguns daqueles soubessem, levando a que a respectiva tomada de posse fosse mais um momento alto de desconsideração geral;
Ministro e amigo de longa data que se demite após 4 dias da tomada de posse, escrevendo uma carta com os epítetos que todos conhecemos.
Sectores económicos que não se coibiram de afirmar alto e bom som que preferiam eleições à falta de estabilidade provocada por PSL;
Igreja a afirmar que temos políticos mas não políticas;
Alusão a que o governo era como um bebé na incubadora, originando que se concluísse que aquele tinha nascido mal.
A lista anterior é só um resumo. A mesma poderia ser muito mais extensa, pois só peca por defeito. No entanto, espelha a falta de sensatez, a inexistência de estadista, a demonstração cabal daquilo que é um mau gestor, cujo sentido de responsabilidade não vai mais longe do que as "Docas".
Ora, esta apreciação leva-me a levantar uma série de questões pertinentes:
É este o homem que queremos para governar o nosso país?
Com os exemplos acima citados, é possível aclamá-lo em campanha eleitoral?
Como dizer às pessoas que P.S.L. é um líder para governar 4 anos quando em 4 meses não poderia ter feito pior?
Quem se atreverá a fazer campanha com ele? Os mesmos que durante estes 4 meses o rodearam? E onde estarão Marques Mendes, Leonor Beleza, Teresa Patrício Gouveia, Manuela Ferreira Leite, Marcelo Rebelo de Sousa, etc.?
Nesta ordem de ideias, não concordando com a análise de alguns observadores, os quais pensam ser conveniente que PSL caia em desgraça pelo seu próprio pé, face à previsível derrota nas próximas eleições, para depois regenerarem o partido, sou de opinião de que se deve promover, desde já, uma vaga de fundo de modo a fazer com que apareça alguém, não como salvador da pátria, mas como galvanizador das energias do PSD e que consiga arrastar este país para a senda do trabalho, da iniciativa, da responsabilização, isto é, rumo ao progresso.
Como certamente observou houve um nome que, de forma propositada, anteriormente não citei: o de V. Exª. Reconheço que é extremamente difícil demovê-lo para que volte à vida partidária, mas já tenho alguns anos e, por isso, sei que, em política, não existem impossíveis.
Porém, creia que muitos existem a pensar como eu, ou seja, é necessário que V. Exª se consciencialize de que o país necessita muito mais de si como primeiro-ministro do que como Presidente da República. A este propósito, tomo a liberdade de lhe pedir que leia, se ainda o não fez, o artigo interessantíssimo do insuspeito António Barreto, publicado no Publico de 2004-12-05.
Senhor Prof., tenha a certeza absoluta que o sentimento das bases é este: esperam ansiosamente alguém que lhes proporcione garantias de ponderação, estabilidade e, acima de tudo, sentido de estado. É que, no fundo, sentem-se órfãos e temem de volta o pântano guterrista, agora revisitado de novas roupagens.
Esperançado no regresso, mais ou menos imediato, de V. Exª queira, entretanto, aceitar os protestos da mais alta consideração.
Hernâni de J. Pereira